terça-feira, 1 de dezembro de 2009

LAMA PARA LIMPAR A ALMA


Milton Ferreira Verderi


Artaud quando usa o termo “crueldade” fala da crueldade metafísica. O teatro da crueldade a que se referiu, é uma maneira de fazer uma crítica sobre a cultura do espetáculo.

Artaud fala sempre de um teatro que não se confina num palco, mas que pode se realizar numa conferência, por exemplo, e que pode se metamorfosear em qualquer situação.

Trata-se de re-elaborar o pensamento e quebrar uma linguagem formal.

Normalmente o discurso está sempre armado e falta a confrontação com o interno, onde o pensamento titubeia. Há uma crueldade nesse pensamento, na confrontação com o nascimento da linguagem.

Nasce de uma atitude interior e de uma experiência também ligada ao interno. E é isso que vai transformar o que Artaud chama de vida. Uma atitude de desarmamento, uma maneira de se lançar ao desconhecido.

Artaud vai negar a idéia de cultura enquanto produção, de consumo. Para ele, a cultura é uma questão social mais urgente. Assim, o artista fala a partir da dor de existir. Uma dor de fundo, este é o impulso metafísico.

Crueldade e interrupção: com o automatizado, com o discurso pronto.

O interromper para abrir-se para outro espaço. Mas antes do analisar, do racionalizar

Crueldade de Artaud: contra a cultura analgésica

“Traje de Banho Para Sujar”, apresentado no dia 28 de novembro na cidade de Catanduva, segue a linha Artaudiana do princípio ao fim , com toques de Pina Bausch e elementos musicais onde temos s impressão de estarmos dentro de uma apresentação de composições de John Cage.

O etéreo, o mundano, a vaidade, a falta da vaidade, o desespero, a primeira menstruação, a perda da virgindade ( com prazer ou não) é discutida de uma forma intensa, onde vemos o poder do feminino, Gaia, explícita, numa nudez arrebatadora e condenadora.

A encenação de Tales Frey, junto com o Galpão 6 e Cia Excessos, aponta o dedo na nossa cara, mostrando o que nós homens e mulheres, fazemos com o feminino interno e externo. Sim, o feminino está incluso em todos os seres. Isto é fato mostrado e confirmado nesta belíssima apresentação!

Uma encenação nada pretenciosa, sem exageros cênicos, e com um grande e necessário exagero de mensagens explícitas ou implícitas, que só enxerga quem “é cego as avessas” como Caetano já disse.

Uma encenação de primeiro mundo, onde tudo se comunica sem palavras, provando que o teatro é uma língua universal!

Um espetáculo para ser apresentado e reverenciado em qualquer festival internacional do mundo, onde tenham curadores de bom gosto.

É a cultura das sensações (do imaginário, do sensível), não da cultura erudita. Mas um teatro que vai do sensorial ao intuitivo. Não é um teatro físico, apenas.

Um comentário:

TALES FREY disse...

Milton, foi um êxtase o que vivi naquele dia com todos. Creio que foi um êxtase vivido por mim, por vc, pelos artistas que integraram o trabalho, pelas pessoas que se permitiram mergulhar na "inter-AÇÃO", enfim, Artaud estava lá sim, no meio da lama, no meio do caos, no meio das tintas... Ele estava lá conosco.
Nietzsche já dizia que no meio do caos surge a estrela bailarina... Acho que ela está dançando até hoje conosco. Sem perder a ponta. Obrigado pela presença.

Obrigado pelas palavras.

Hasta luego.

Bjs...