terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Panorama do Teatro Brasileiro – Parte 2





Milton Ferreira Verderi

Do século XVII ao início do século XIX o teatro é marcadamente colonial, fortemente influenciado pelo teatro português. Os primeiros textos, como o ''Auto da festa de S. Lourenço'', do padre José de Anchieta, são escritos pelos jesuítas de Piratininga, numa mistura de espanhol, português e tupi-guarani. Visam a catequese e são encenados pelos indígenas.

Em Minas Gerais, durante o século XVIII, atores portugueses visitam Vila Rica. A única peça local preservada é ''O parnaso Obsequioso'', de Cláudio Manuel da Costa, em homenagem ao aniversário do governador.

No Rio de Janeiro, na segunda metade do século XVIII, o Teatro do padre Ventura encena as "óperas" - na verdade, comédias entremeadas de canções - de Antônio José da Silva, o Judeu ''Guerras do Alecrim e Mangerona'', autor nascido no Brasil mas que vive praticamente toda sua vida em Portugal. E o Teatro de Manuel Luís importa espetáculos de Portugal e da Espanha.
As representações acontecem principalmente em ocasiões festivas, quando grupos amadores montam, em praça pública, peças de tom popular, louvando as autoridades. Depois que a sala do padre Ventura é destruída por um incêndio (1769) e a de Manuel Luís é fechada, D. João VI manda construir, em 1810, o Real Teatro de São João, atual João Caetano, onde também se exibem atores portugueses. Só no romantismo surge um teatro com características nacionais.
Romantismo
Primeira metade do século XIX. No reinado de D. Pedro I, surge o primeiro grande ator brasileiro, João Caetano dos Santos. No ano seguinte, ''O juiz de paz na roça'' revela Luís Carlos Martins Pena, cujas comédias fazem uma crítica bem-humorada da sociedade da época.
Os dramas ''Leonor de Mendonça'', de Antônio Gonçalves Dias, e ''Gonzaga'' ou ''A revolução de Minas'', de Antônio Castro Alves; e as comédias ''A torre em concurso'', de Joaquim Manuel de Macedo, e ''O demônio familiar'', de José de Alencar , vêm ampliar o repertório nacional.

João Caetano (1808-1863) é considerado o primeiro grande ator brasileiro. Especializado em papéis dramáticos, trabalha em peças de autores como Victor Hugo, Shakespeare, Alexandre Dumas Filho e Molière. Sua montagem de ''Antônio José'' ou ''O poeta e a Inquisição'' (1838), de Gonçalves de Magalhães, dá início a um teatro com temas e atores brasileiros. No livro ''Lições Dramáticas'' reflete sobre a arte de representar.

Luís Carlos Martins Pena (1815-1848) nasce no Rio de Janeiro, de família pobre. Torna-se diplomata, chegando a adido em Londres. Utiliza com maestria a linguagem coloquial e faz rir com situações engraçadas envolvendo pessoas do interior em contato com a corte em peças como ''O juiz de paz da roça'', ''Um sertanejo na corte'' e ''A família e a festa na roça''. É o primeiro dramaturgo importante do cenário brasileiro e um dos primeiros a retratar o princípio da urbanização do país.


Realismo
Segunda metade do século XIX. A reação aos excessos românticos já se percebe numa peça de transição, como ''ALição de botânica", de Joaquim Maria Machado de Assis . Joaquim José da França Júnior ''Como se faz um deputado'', ''Caiu o ministério'' traça, num tom bem amargo, o painel das maquinações políticas do 2º Império. Igualmente satírico, mas brincalhão, é o tom de Artur de Azevedo. Também Henrique Maximiano Coelho Neto pratica, em ''Quebranto'' ou ''O patinho feio'', uma comédia de costumes ágil e leve.

Mas as companhias nacionais são precárias, e os atores mais aclamados - Furtado Coelho, Lucinda Simões e Adelaide Amaral - ainda são portugueses.
Artur de Azevedo (1855-1908) nasce no Maranhão e muda-se para o Rio de Janeiro em 1873. Além de se dedicar ao teatro, trabalha também como jornalista. Cria, com ''As burletas'', ''O mambembe'' ou ''A capital federal'', a comédia musical brasileira. Escreve também paródias de dramas franceses. Sua importância não se restringe ao texto, atua também divulgando obras de outros autores. Pouco antes de morrer é nomeado diretor do Teatro da Exposição Nacional.
Simbolismo
Primeiros anos do século XX. De uma produção muito irregular, que se limita a copiar autores europeus, salvam-se ''Eva'', de João do Rio (pseudônimo de Paulo Barreto); ''O Canto sem palavras'', de Roberto Gomes; e ''A comédia do coração'', de Paulo Gonçalves. Mas o isolamento criado pela 1ª Guerra Mundial gera um embrião nacionalista que se manifesta, sob a forma de temática regional, em ''Flores de sombra'', de Cláudio de Sousa, e ''Onde canta o sabiá'', de Gastão Tojeiro.
Modernismo
Embora o teatro seja a arte menos atingida pela Semana de Arte Moderna de 1922, uma de suas conseqüências é a criação, por Álvaro Moreira, do Teatro de Brinquedo, que estréia com ''Adão, Eva e outros membros da família'' (1927). Escrita em linguagem coloquial, coloca em cena, pela primeira vez, como protagonistas, dois marginais: um mendigo e um ladrão. Esse exemplo será seguido por Joracy Camargo em ''Deus lhe pague'', primeira peça brasileira a obter sucesso no exterior.
Companhias Nacionais
Leopoldo Fróes cria a primeira companhia inteiramente nacional depois de voltar de Portugal, em 1908, e procura fixar uma dicção teatral brasileira, livre dos maneirismos herdados de atores portugueses. Para seu grupo contribuem Viriato Correa (Sol do sertão), Oduvaldo Vianna (A casa do tio Pedro) e Armando Gonzaga (Cala a boca, Etelvina!).
Nas décadas de 30 e 40 Jaime Costa, Procópio Ferreira , Abigail Maia e Dulcina de Moraes fundam suas próprias companhias, ativas até o fim dos anos 50.
A húngara Eva Todor, naturalizada brasileira, e seu marido, Luís Iglésias ''Chuvas de verão'', além de apresentar comédias leves, revelam textos de Bernard Shaw, Ferenc Molnár e Henryk Ibsen.



Modernização do Teatro
Geração TBC - Teatro Brasileiro de Comédia
Em 1948 o industrial italiano Franco Zampari funda, em São Paulo, o Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), marco na história do teatro brasileiro. A posição de preponderância que ocupa deve-se à incorporação de novos talentos: Nídia Lícia, Paulo Autran, Cacilda Becker , Sérgio Cardoso, e à importação dos diretores italianos Luciano Salce e Adolfo Celli, que ajudam a formar os brasileiros Flávio Rangel e Antunes Filho. Com o sucesso em São Paulo, o TBC abre uma filial no Rio.

As companhias de Eva Todor, Maria Della Costa, Dulcina e Odilon, Procópio e Bibi Ferreira são contratadas para excursionar em Portugal e suas colônias. Os problemas criados por uma estrutura grande e onerosa, a morte de Franco Zampari e cisões entre os membros do elenco fazem com que, ao longo da década de 50, o TBC se desmembre nos grupos de: Tônia Carreiro, Paulo Autran e Margarida Rey, dirigido por Adolfo Celli; de Cacilda, o marido Walmor Chagas e a irmã Cleyde Yáconis, dirigido por Ziembinski; o Teatro dos Sete, de Fernanda Montenegro, Italo Rossi e Sérgio Brito; e o de Sérgio Cardoso e Nídia Lícia.
Contribuição Estrangeira
Na década de 40 alguns atores do Leste europeu refugiam-se no Brasil. Entre eles, estão o ucraniano Eugênio Kusnet, ator e professor que vai ter importância crucial na primeira fase do Teatro Oficina ao introduzir com todo o rigor o método Stanislavski; e o polonês Zbigniew Ziembinski , que, com o cenógrafo Gustavo Santa Rosa, funda Os Comediantes, com os quais monta Pirandello, Eugene O'Neill e Arthur Miller.

O trabalho de Ziembinski em ''Vestido de noiva'', de Nelson Rodrigues, encenada em 1943, transforma o papel do diretor de teatro no Brasil. Até então não se conhecia a figura do diretor como responsável pela linha estética do espetáculo, ele era apenas um ensaiador.
Revolução na Dramaturgia
O pioneiro da moderna dramaturgia brasileira é Nelson Rodrigues, que constrói uma obra coerente e original, expondo o inconsciente da classe média com seus ciúmes, loucuras, incestos e adultérios.

Nelson Rodrigues (1912-1980) nasce no Recife e ainda criança muda-se para o Rio de Janeiro. Filho de um jornalista, começa aos 13 anos a trabalhar como repórter no jornal do pai. Resolve escrever para teatro para aumentar sua renda. Sua primeira peça encenada é ''Mulher sem pecado'', em 1942. Mas o marco da moderna dramaturgia brasileira é ''Vestido de Noiva'' - texto fragmentário e ousado sobre as lembranças e delírios de uma mulher que agoniza durante uma cirurgia.

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